Força e fé de Rosa dos Anjos: mãe de autistas é exemplo de um Brasil lutador
- Gustavo Santos
- há 2 dias
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Atualizado: há 12 horas

Entre madrugadas que começam antes do sol e noites que terminam muito depois do cansaço, ela ergue sua vida sobre pilares que poucos veem: resiliência, coragem e amor incondicional pelos filhos.
Suas forças física e espiritual são visíveis, materializadas na sua personalidade. Forças que lhe movem adiante, em um percurso difícil, mas nada impossível para Rosenilde Cantaneide dos Anjos, 38 anos, a Rosa dos Anjos.
Ouvi-la por algumas horas foi como uma aula sobre lutas, amor de mãe, mas, sobretudo, a fé. José e João são meninos bonitos, fortes como Rosa, e sempre buscando a atenção da mãe. Com sorrisos largos, brilhantes, os irmãos autistas esbanjam vitalidade e comportamentos diferentes, cada um à sua maneira.
“É por eles que eu vivo”, diz Rosa, logo de início. A missão de cuidar de dois garotos o tempo todo, com ou sem fôlego, sobrevivendo de auxílios e doações, trouxe essa jovem mãe a buscar recursos em São Paulo.

Há 10 anos, Rosa e os filhos José Augusto (23 anos), Rosileine (19) e José Inácio, então com um ano de vida, deixaram a pequena comunidade nas cercanias de Alcântara, no Maranhão, e vieram para a região de Campinas em busca de suporte para o tratamento do mais novo.
Depois do auxílio de especialistas em um hospital infantil em São Luís, capital, e muita ajuda extra de amigos e familiares, Rosa conseguiu partir em um ônibus, rumo ao sul do país. Solteira, poucos recursos, e em busca de condições para a família, a mudança deu uma guinada na vida de todos.
TUDO POR ELES
“José não falava até os cinco anos. Hoje fala. Isso foi conquista de cada dia, com ajuda de profissionais e da minha fé”. Enquanto Rosa nos conta sua história, José e João estão sob os cuidados de especialistas. A alguns metros dali, João seguia em sua terapia em cima de um bonito cavalo, e de lá chamava os olhares da mãe.

É por entre as sombras das árvores, consultórios, e cavalgadas, onde Rosa, José e João passam todas as tardes, há alguns anos. Na zona rural de Jaguariúna-SP, o Centro de Referência do Autismo (CAJ), que atende em média 150 pessoas, foi o local em que a família dos Anjos ganhou acolhimento, tratamento, e onde Rosa busca um porto-seguro para os filhos, diariamente.
“Não tenho vergonha da minha história. Por que se Deus me escolheu para ser mãe de autistas, é por que Ele sabe que eu tenho a competência de cuidar”. Sempre grata aos que lhe ajudam, é em Deus onde Rosa busca forças.
“E eu sou uma mãe especial, por que tenho dois filhos especiais”. Rosilene, de 19 anos, está sempre no auxílio da mãe. Apesar de viver um relacionamento em outro lar, a jovem está presente na rotina dos irmãos.
No ano passado, quando Rosa teve que ser operada as pressas por causa de pedra na vesícula, foi a filha quem cuidou dos irmãos. Logo após a cirurgia, uma hemorragia interna complicou a situação da maranhense, que precisou estender o período de internação.
“Foram horas de cirurgia. E meu medo maior naquele momento era deixar os meus filhos”, recorda.
LEVANTO E LUTO
João, de 7 anos, teve um cisto na cabeça ainda recém-nascido. Nos primeiros momentos de vida, Rosa foi alertada de que ele precisaria de cuidados ao longo da vida.
Foi uma gravidez inesperada, mas cultivada com muito amor. Ela se recorda quando José estava nas fases iniciais de tratamento no CAJ, e João, bebê, passava de colo em colo entre os profissionais e frequentadores do centro.
“O José não parava um segundo, e todos me ajudavam a olhar o João”, lembra. Logo os profissionais identificaram o transtorno do espectro autista (TEA) em João. E com o tempo, o classificaram em nível 3.
Tal nível, segundo profissionais, é considerado um autismo severo, quando o indivíduo necessita de um apoio muito substancial para a rotina do dia a dia. “Naquele momento eu já estava conformada”, diz Rosa.

João e José são carinhosos, ouvem a voz da mãe com atenção e demonstram respeito e entendimento. Apesar de algumas dificuldades pontuais de comunicação e de picos de agitação das crianças, Rosa conversa muito com os dois. “Ensino eles para ter muito respeito com as pessoas”.
Quando o cansaço e os pensamentos embaçados chegam, Rosa se ajoelha, busca forças para levantar o peso da vida e novamente se coloca a caminhar. O choro, diz ela, precisa escorrer isolado, para ninguém perceber fraqueza, tampouco os meninos.
“Tem dias que acordo balançada, como hoje, mas levanto, luto e consigo”, agradece ela, novamente ao seu alicerce espiritual.
SONHOS E FORÇA
Tem dias em que na geladeira da família há somente um peito de frango. Rosa não reclama. Senta-se à mesa e agradece pelo pouco que tem.
“Se me perguntam se aceito isso ou aquilo de doação, no mesmo momento sempre digo sim. Se é de coração, sei que vai ajudar minha família”.
Ela e os dois meninos vivem em dois cômodos de uma casa no bairro Cruzeiro do Sul. O aluguel de R$ 900,00 é pago com boa parte do auxílio que recebe dos filhos. Já por parte da prefeitura, recebe cesta básica, leite e também os remédios dos meninos.
Mas Rosa mantém a fé na casa própria. Ela está no grupo prioritário do programa do governo federal, e aguarda esperançosa seu próprio lar. No município estão sendo construídas mais de 100 casas populares, e uma poderá ser de Rosa.

A força física para aguentar a rotina exaustiva é um de seus principais desafios de. Ela mostra um arranhão no braço esquerdo, causado por um momento de crise de um dos filhos. É preciso ter força para acalmar diversas situações.
Por isso, é na academia que a mãezona trabalha sua força e, por breves momentos, tenta amenizar o peso da vida. Quilos de ferro moldam os braços, pernas e, nas redes sociais, Rosa torna-se inspiração para muitos seguidores. A mensalidade, explica, é paga por um voluntário, que conhece sua trajetória.
“Eu tenho que cuidar de mim para estar bem para João e José. Corpo e mente precisam estar fortes para seguir em frente”.
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